Por Cláudio Gradilone
Estratégica para os resultados do grupo, a seguradora aposta na tecnologia para fazer frente à queda de juros
Octavio de Lazari Junior tem um desafio diário ao chegar à sede da Bradesco Seguros, localizada em um moderno prédio em Alphaville, na região metropolitana de São Paulo. A cada dia, ele tem de fazer os 25 mil gerentes do Bradesco e os 40 mil corretores independentes venderem oito mil apólices de seguros para automóveis. Se não fizerem isso, a carteira de 1,6 milhão de veículos vai encolher, hipótese na qual Lazari não quer nem pensar. A proteção para automóveis representa cerca de 10% dos resultados totais da seguradora que o executivo preside. No entanto, aos 54 anos, 40 deles passados no Bradesco, ele sabe que essas apólices são estratégicas para vender outros produtos. Um dos potenciais sucessores de Luiz Carlos Trabuco na presidência do Bradesco, Lazari era, até o fim de 2017, o diretor responsável pela rede, área estratégica para qualquer banco. Um observador de fora poderia pensar que a ida para o comando da seguradora representa um afastamento do centro das decisões. Ledo engano. O caso do Bradesco é único na paisagem financeira brasileira. Com ou sem crise, ano após ano, os resultados da seguradora representam um terço do ganho total do grupo. “A seguradora funciona como um hedge, uma proteção para os resultados do banco quando a economia piora e a inadimplência aumenta”, diz o analista Rafael Passos, da Guide Investimentos. Assim, manter os gerentes vendendo apólices e planos de previdência é fulcral. Mais ainda em 2018.
O cenário de juros consistentemente baixos é bom para o Bradesco. O banco ainda não informou seu resultado para 2017, nem a projeção oficial (guidance) para 2018. Porém, ao divulgar os resultados do terceiro trimestre, em novembro, Alexandre Glüher, diretor responsável pelas relações com investidores, afirmou esperar um novo ciclo de expansão do crédito. Esse cenário, no entanto, é ruim para a seguradora. Selic menor reduz a rentabilidade dos R$ 260 bilhões em reservas técnicas. Com isso, o índice combinado, que reúne o ganho financeiro com os prêmios de seguros, deve cair nos próximos meses. “A participação dos resultados da seguradora vai encolher, mas isso será mais do que compensado pelo aumento dos ganhos do banco com os empréstimos”, diz Lazari. Ele e Glüher estão entre os sete diretores vice-presidentes na lista dos potenciais sucessores de Trabuco. A decisão deve ser anunciada no fim de janeiro.
A estratégia para o novo cenário é apostar na tecnologia, para ampliar a participação dos produtos da seguradora junto aos clientes do banco, hoje em apenas 1,6 produto por cliente. Isso está em linha com o novo mantra que Trabuco implantou no Bradesco em novembro, quando substituiu Lázaro de Mello Brandão na presidência do Conselho de Administração: preservar o que deve ser preservado e ajustar o que tem de mudar. A tecnologia ajuda não só na contratação das apólices, mas também na formação de preço. Cerca de 250 mil dos 1,6 milhão de segurados já instalaram o aplicativo “Dirija melhor” em seus celulares. Com recursos de georreferenciamento, o aplicativo diferencia quais motoristas trafegam de maneira segura, e quais abusam das acelerações e freadas bruscas. Estes oferecem mais risco que aqueles, e, por isso, deveriam pagar mais pelas apólices. “Hoje, a formação de preço não diferencia o comportamento ao volante, que é uma variável essencial no cálculo do risco”, diz ele. “Ao premiar os motoristas mais responsáveis nós nos tornamos mais competitivos e, de quebra, contribuímos para melhorar o trânsito.”
Outro dos pilares dessa estratégia é uma aposta no mercado imobiliário. Ao expandir as atividades do banco para uma nova cidade, principalmente nas décadas de 1950 e 1960, Amador Aguiar, fundador do banco, comprava um terreno grande, de 500 ou mil metros quadrados, invariavelmente localizado em frente à igreja ou à prefeitura, e sempre ao lado de uma grande loja, para garantir que a agência fosse visível e tivesse espaço para a multidão que passava à frente da porta todos os dias. O tempo passou, e hoje são cerca de mil lotes ocupados quase que apenas por agências, edifícios de um ou dois andares, um patrimônio estimado em R$ 7 bilhões. Esse ativo agora está sendo gerido por uma empresa imobiliária, subordinada à seguradora. A meta é, em três anos, elevar o valor para R$ 21 bilhões e garantir uma rentabilidade mensal estimada em R$ 600 milhões. O próprio edifício ocupado hoje pela seguradora foi construído em um terreno que pertencia ao grupo, em parceria com uma incorporadora. “Temos o ativo mais valioso e mais difícil de encontrar no mercado imobiliário, que são terrenos disponíveis bem localizados”, diz Lazari. “Vamos colocar esse capital para render.”
Fonte: Isto É Dinheiro, em 05.01.2018.