Por Antonio Penteado Mendonça
É curioso, mas corrupção para o brasileiro é mais uma questão de valor do que de ação. Não há muita diferença entre subornar o agente de trânsito para não apreender a carteira de motorista e subornar um ministro para facilitar uma concorrência. Os dois implicam em dar dinheiro em troca de uma vantagem ilegal. Os dois são crimes. O que varia é a ordem de grandeza. No entanto, é comum as pessoas aceitarem o primeiro, ao mesmo tempo que apoiam a Operação Lava-Jato no combate ao segundo.
Neste cenário, no mínimo, flexível, é comum um segurado considerar normal emprestar sua carteirinha do plano de saúde privado para alguém próximo ir ao médico sem pagar. Da mesma forma, não é raro uma proposta de seguro de automóvel ter como endereço do segurado um local onde o seguro é mais barato e, de verdade, o veículo ser utilizado em outra região, onde o seguro custa mais caro.
Estas são situações fáceis de identificar e um pouco de atenção de seguradora é suficiente para impedir o prejuízo. Mas existem casos muito mais sofisticados, nos quais a seguradora não consegue provar a fraude. Não é um fenômeno brasileiro. No mundo inteiro, um percentual significativo das indenizações é pago em função de algum tipo de fraude cometida contra a seguradora. A criatividade humana é quase ilimitada e sua aplicação para levar vantagem faz parte da história, em passagens que vão do Cavalo de Tróia a golpes como o do bilhete premiado, aplicados contra incautos ou, como dizem os “profissionais”, contra os “patos” que caem na sua lábia e acabam pagando caro pela história bem contada.
Dependendo do país, estima-se que a fraude contra seguradoras varie entre 10 e 20%, podendo ser mais alta em locais onde os controles são mais frágeis. O Brasil não foge desta média. Apesar de não haver uma análise científica abrangente sobre estes dados, é comum se aceitar que entre 15 e 20% do total das indenizações são pagos em decorrência de golpes armados contra o seguro.
Parte deste total é precificado. Como as seguradoras sabem que não conseguirão apurar ou demonstrar todas as fraudes, colocam na conta do preço do seguro um percentual destinado a fazer frente a elas. Ou seja, o bom segurado paga o custo do crime cometido contra a companhia. Pode parecer injusto, mas é a única forma da seguradora evitar o comprometimento do mútuo com o pagamento de indenizações indevidas, fruto de golpes ou de eventos sem cobertura.
Quando falam em fraude contra o seguro, as pessoas normalmente pensam em dois grandes blocos: as fraudes de ocasião e as fraudes planejadas e deliberadamente cometidas.
As fraudes de ocasião são ações levadas a cabo por pessoas que não costumam praticar atos ilegais, mas que, diante de uma situação de aperto pessoal ou de uma facilidade para levar vantagem, decidem cometer o delito, enganar a seguradora e ganhar um dinheiro fácil em cima dela.
Este tipo de ação aumenta em épocas de crise, quando as pessoas estão com dificuldades empresariais ou pessoais e, para conseguir algum alívio, tentam dar o golpe em cima da companhia de seguro.
É comum nestas épocas se verificar o aumento de comunicações de furtos e roubos de veículos, acidentes com embarcações e até o aumento de casos de acidentes pessoais, com casos concretos de automutilação.
Na hora do aperto, vale tudo para sair do buraco. O problema é que as seguradoras têm estrutura operacional para levantar boa parte destes casos e o resultado é que as indenizações invariavelmente não são pagas.
As fraudes deliberadamente praticadas são muito mais sofisticadas e muitas vezes a seguradora, apesar de ter certeza do golpe, não consegue as provas necessárias para demonstrar a ação criminosa e acaba obrigada a pagar a indenização.
Mas existe ainda um terceiro tipo de fraude, pouco comentado, mas que causa estragos de monta. São as fraudes internas, aquelas praticadas com a participação de funcionários da companhia. Invariavelmente, são as mais difíceis de serem detectadas e as que causam maiores prejuízos.
Fonte: O Estado de São Paulo, em 07.01.2019.