Por Antonio Penteado Mendonça
Diz a música que as chuvas de verão terminam em março. Pode ser, mas este ano faltou alguém contar isso para elas. As chuvas entraram outono a dentro e têm atingido graus de violência comparáveis às tempestades mais fortes dos meses de verão.
Especialistas explicam o fenômeno culpando o “El Niño”, que esquenta as águas do Oceano Pacífico, com consequências complicadas para o clima da América do Sul e do Brasil em particular. Seja realmente isto, seja qualquer outro motivo ainda não comprovado, o fato é que em abril deste ano choveu como manda o figurino e algumas tempestades causaram danos severos, especialmente no Rio de Janeiro e em São Paulo. Pessoas morreram, morros deslizaram, houve desmoronamentos, enchentes atingiram imóveis, empresas e famílias perderam bens, etc.
É verdade que as tempestades que atingiram o Brasil não se aproximam da severidade dos tufões e furacões que varreram outras áreas do mundo, entre elas Moçambique, que teve mais de mil mortos no mesmo período.
Mas isso não quer dizer que o Brasil pode ficar deitado em berço esplêndido, olhando de fora o que acontece no mundo. Os danos nacionais, numa conta conservadora, atingem tranquilamente a casa do bilhão de reais e este valor está perdido, porque o Estado demora para agir e, quando o faz, é em valores muito abaixo das perdas.
Como se não bastasse, as seguradoras, que poderiam ficar com parte importante dessas perdas, indenizam muito pouco porque o brasileiro, grosso modo, não tem seguro para estes riscos.
Não que eles não possam ser cobertos. Boa parte tem proteção nas apólices empresariais e residenciais normalmente comercializadas no país. Acontece que os segurados não compram a proteção e o resultado é que apenas os danos sofridos pelos veículos com seguros compreensivos são indenizados.
Muita gente não sabe, mas o seguro compreensivo de automóveis, a garantia que indeniza colisão, incêndio e roubo, indeniza os danos causados pela água, queda de árvore, desmoronamento, granizo e outros danos de origem climática que atinjam o veículo segurado.
Já os seguros residenciais e empresariais têm garantias acessórias que podem ser contratadas e que fazem frente a várias perdas causadas por eventos climáticos, mas nem todos os riscos podem ser cobertos, entre eles, os danos causados pelas enchentes, que estão entre os mais gravosos do país.
Não que não exista garantia para eles. Existe e no resto do mundo são regularmente contratadas. Acontece que o Brasil não é famoso por contratar seguros, então a baixa penetração das apólices faz com que não haja massa de prêmios, nem pulverização dos riscos que permitam que as seguradoras ofereçam essas garantias sem perder dinheiro.
o passado, as apólices nacionais tinham cobertura para alagamentos e inundações. Acontece que o clausulado para elas está completamente ultrapassado e até agora nenhuma seguradora apresentou um produto mais moderno.
As seguradoras acusam as resseguradoras e as resseguradoras dizem que a culpa é das seguradoras. O fato concreto é que hoje não há seguro contra enchente à disposição do brasileiro.
Como as mudanças climáticas devem se agravar e a função do seguro, ainda que sendo negócio, é proteger a sociedade, é de se esperar que, em algum momento não muito distante, a garantia de enchente, ou danos causados pela água, seja oferecida para o mercado.
Mas, ainda que isso aconteça rapidamente, a situação deverá continuar muito séria. Boa parte da população não tem dinheiro para contratar seguros, mesmo os mais simples. E o governo não dá mostras de estar preocupado em modificar a realidade nacional, reorganizando a ocupação do solo, especialmente impedindo ou realocando as milhares de pessoas que invadiram zonas de risco.
Enquanto não houver uma política séria, destinada a ordenar a ocupação do território nacional, especialmente as zonas urbanas mais carentes, não há o que fazer, continuaremos sofrendo com as tempestades e outros eventos de origem climática. E os prejuízos continuarão sendo integralmente suportados pelas vítimas.
Fonte: SindSeg SP, em 10.05.2019.