Por Paulo Leão de Moura

Paulo Leao de MouraComo deveria ser uma corretora de seguros corporativos, tendo como objetivo maior ser uma prestadora de serviços de gerenciamento de riscos e seguros a seus clientes? Seria uma suposição utópica diante do alto custo que essa prestação de serviços poderia representar? Haveria lugar para esse tipo de corretora no nosso mercado?

Certamente seria algo que a maioria das empresas procura e, até mesmo, que inúmeras corretoras pretendem ser sem na verdade atingirem ao menos os serviços que apregoam.

Quais são, de fato, os aspectos que estão diretamente relacionados aos serviços de gerenciamento de riscos e seguros?

Gerenciamento de risco: esta função é da competência e ação direta do próprio segurado. A empresa deve assumir sempre, ela própria, o gerenciamento de seus serviços. Atualmente, porém, essa função da febre relacionada à real necessidade de governança e, sobretudo da conformidade (compliance), as empresas deveriam adotar o Enterprise Risk Management – ERM e não a tratativa simples dos seus riscos puros. Cabe ressaltar, no entanto, que atualmente não se concebe o gerenciamento e a administração do programa de seguros, sem que estejam previamente alicerçados por procedimentos permanentes e inerentes ao processo de análise, principalmente quanto aos aspectos de identificação, de avaliação de evolução e de controle de riscos. Assim, na administração de seguro é vital a ação e atitude permanente da gerência de risco nas ações de qualquer corretora de seguros corporativos.

Administração de seguros: o programa de seguros que será adotado pela empresa segurada é o que irá resultar da análise de riscos realizada, que irá determinar o que a empresa segurada deverá transferir ao seguro, após a adoção de todas as medidas de controle de risco - procurando condições da empresa assumir até alguns riscos – e adotar sistemas de segurança e proteção que minimizarão o impacto possível e provável de certos riscos, adequando o programa de seguros e suas coberturas a real necessidade da empresa e redefinindo o seu preço justo ao mercado segurador.

Na administração do seguro o mais importante não é necessariamente tão só a elaboração ideal do programa de seguros a ser adotado. Tão ou mais importante é o acompanhamento sistemático da evolução dos riscos gerais da empresa, desde a implantação e colocação do programa de seguros aprovado junto ao mercado segurador / ressegurador até o seu vencimento previsto. Esse serviço une as atividades do gerenciamento de risco e da administração dos seguros em vários aspectos relevantes por parte da corretora de seguro, prestadora dos serviços. Esses serviços visam o acompanhamento da evolução dos riscos e as medidas necessárias a alterar o programa de seguros, para acompanhar justamente essa evolução, envolvendo ampliação ou redução de coberturas impactando aumento ou redução de taxas e prêmios, franquias, importâncias seguradas etc.

Além dessa atividade existem, ainda, as alterações necessárias consequentes de ações de controle de risco, com implantação de novas medidas de proteção e segurança e de minimização de riscos.

Acresce, ainda, a atividade de regulação de sinistros que venham a ocorrer em total cooperação com os segurados, as seguradoras e seus reguladores e resseguradores também. Em função das grandes dificuldades atuais no processamento de sinistros por parte das seguradoras, esta atividade é de extrema importância, pois, em tese ao menos, se adotado o sistema, as seguradoras não teriam argumentos para recusar indenização de sinistro. Hoje em dia, praticamente todos os sinistros, independente da cobertura, são discutidos energicamente pelos seguradores e seus reguladores e peritos. A assessoria e atuação nas regulações é, portanto, parte essencial na prestação de serviços da corretora de seguros.

Com base nessas considerações, como deveria ser estruturada a corretora de seguros corporativos para prestar esses serviços?

Aí iniciam-se os procedimentos e reflexões, aparentemente utópicos, face ao comportamento operacional e de custo do nosso mercado. Como sonhador que sou, julgo factível esse sistema.

Além das condições básicas inerentes a qualquer empresa, com processos adequados e modernos de governança e compliance, de sistemas centrais de marketing, TI, RH, assessoria legal e outros, na parte diretamente relacionada à prestação de serviços, teríamos necessariamente as seguintes operações:

Setor Comercial: este setor formado essencialmente pelos chamados “produtores”. Responsáveis por representar a empresa na atividade fim de produzir novos clientes. A sua função e a de demonstrar a importância dos serviços pretendidos e convencer o “prospect” da conveniência e adequação do programa oferecido. Não se trata, especificamente de “vender” seguros, nem tampouco pode ser essa a intenção, embora seguros façam parte dos serviços a serem concedidos, isto é, na aplicação do programa de seguros final e na administração do programa. O serviço a oferecer é amplo, pois envolve a totalidade dos interesses do segurado em relação a riscos e seguros e estará baseado nos processos de gerenciamento de riscos.

Setor de Serviços: este setor é formado pelos chamados “executivos de contas”. Responsáveis diretos pelos serviços aos clientes irão substituir os “produtores”. Não é possível imputar aos “produtores” a função de prestadores dos serviços aos clientes. Se o fizermos, em pouco tempo iremos impedir os “produtores” de “produzirem”. Essa função cabe ao prestador e mantenedor dos serviços, o “executivo de contas”. No início dos serviços, “produtores” e “prestadores” atuarão concomitante junto ao cliente, cabendo ao “produtor” verificar se o “executivo de contas” está atendendo adequadamente o cliente. Da mesma forma é importante entender quantos clientes podem ser atendidos por um único “executivo de contas”: depende do volume de serviços e tamanho do cliente. Dependendo do cliente e do trabalho envolvido, cada “executivo de contas” poderá atender de cinco a vinte contas. Eventualmente, o problema a ser resolvido e objeto de solução possível é a questão de “produtores” que tenham participação nas comissões das corretoras e que devem ser conciliadas à prestação de serviços.

Para que os dois setores acima possam realmente atuar de forma profissional junto aos clientes terão que ser apoiados por setores técnicos fixos da empresa corretora, a saber:

Setor de gerenciamento de risco: este setor terá como responsabilidade a análise efetiva dos riscos dos segurados indicados pelo setor comercial ou “produtor”. Deverá definir, em conjunto com os “produtores” qual a solução ideal para o problema apresentado, desde um assunto específico até um programa de tratativa de riscos.

Uma vez introduzido o cliente, este setor passará a atender o “executivo de contas” designado para a prestação de serviços ao cliente, principalmente nas inspeções de risco, análise permanente da evolução dos riscos e a sua adequação ao programa de seguros. Deve, ainda, assessorar o cliente na análise e “due dilligence” envolvendo novos projetos e empreendimentos do segurado. O “executivo de contas” tem a obrigação de sempre manter o gerenciamento do risco no acompanhamento de serviços ao cliente.

Setor técnico: este setor terá como responsabilidade a análise efetiva dos seguros propriamente ditos envolvidos nas propostas de serviços por parte dos “produtores” e nos atendimentos de serviços por parte dos “executivos de contas”. A função principal é de tecnicamente apresentar o programa de seguros ideal, adequação das coberturas, valores em risco corretos, importâncias seguradas e franquias adequadas e, principalmente, todos os serviços envolvidos na negociação da aceitação do seguro pelo mercado, com preço compatível com o risco colocado.

Deverá ter uma atuação conjunta, com troca permanente de informação, com o setor de gerenciamento de risco. Da mesma forma o “executivo de contas” tem a obrigação de sempre manter o setor técnico no acompanhamento de serviços aos clientes.

Setor de sinistros: este setor terá como responsabilidade o acompanhamento desde o início da regulação de todo e qualquer sinistro que venha a ocorrer. Deverá manter relacionamento estreito com os setores de gerenciamento de risco e setor técnico, na análise dos eventos que levam ao sinistro, nos aspectos de cobertura, de exclusão, de atendimento às obrigações do segurado e, se necessário, acesso a apoio legal do processo de regulação. Deverá apoiar permanentemente o “executivo de contas” nos aspectos relativos à regulação de sinistros e negociação junto às seguradoras até a liquidação final dos sinistros.

A meu ver, utopia ou não, essa seria a estrutura mínima que uma corretora de seguros corporativos deveria manter para ser realmente considerada uma prestadora de serviços.

A utopia mencionada tende a não germinar em um mercado de seguros onde prevalece a ignorância de seus riscos e a procura incessante de redução de seus custos de seguros por parte da maioria dos segurados.

(05.03.2018)